Homem anfíbio: o ribeirinho e a rotina das águas na Amazônia


A pesquisadora Therezinha Fraxe fala ao portalamazonia.com sobre o fato ribeirinhos convivem com o clico de cheias e vazantes na região.
Foto: Divulgação


Jucara Menezes e Isaac de Paula portalamazonia


MANAUS – “As famílias do interior vivem da simbiose da floresta e da água”. A afirmação é da pesquisadora Therezinha Fraxe, e, por mais romântica que possa parecer, reflete bem a realidade do amazônida. Em uma região onde o ciclo dos rios tende, sim, a ditar o ritmo da vida da população, fenômenos da cheia e vazante já fazem parte do cotidiano do que a doutora em sociologia chama de “homem anfíbio” – esse cidadão que aprendeu a adaptar-se entre a subida e a descida das águas.

Therezinha lembra o ambiente amazônico é diferente de tantos outros, justamente porque na região, não é possível estabelecer, por tempo indeterminado, os limites entre o que é superfície terrestre e aquática. São as severas secas, que aumentam as distâncias, dificultando o acesso, enquanto meses depois grandes cheias transformam as moradias dessa população em “ilhas-palafita”, isoladas pela água.

Este último cenário é o que se vê, atualmente, no Amazonas. O Estado tem 52 cidades em situação de emergência por conta da subida das águas dos rios. Ao todo, a Defesa Civil estima que 75 mil famílias tenham sido afetadas pelo fenômeno. E enquanto as águas do rio não recuam, esses amazônidas criam mecanismos para permanecer em casa. Marombas elevam os pisos à altura cada vez mais próximos ao teto das residências. Pequenas plantações são suspensas e os animais são levados para longe, em busca de terra firme.

Entretanto, a cheia deste ano tem uma peculiaridade. “A subida repentina – nas cheias anteriores, o ápice chegava ao fim de junho e de forma vagarosa -, foi surpreendente. Não é à toa que está acontecendo uma grande sensibilização, até mesmo nacional. As comunidades próximas – Manacapuru, Careiro da várzea, Iranduba e Itacoatiara estão sofrendo muito, porque vivem do que produzem e dessa simbiose da floresta e da água”, descreve Therezinha Fraxe.

A pesquisadora conta que os ribeirinhos passam por um período crítico. Nas comunidades visitadas por ela e sua equipe, constatou-se as precárias condições de existência da população. Mesmo acostumados às cheias e vazantes, o homem do interior não se habitua a tamanha invasão da natureza. “Uma coisa é estar esperando o ciclo das águas, outra é a subida recorde. As famílias estão vivendo de forma subumana. A comida é difícil, pois as produções de várzea desapareceram. As águas chegam até a metade dos troncos das árvores, matando seus frutos ou mesmo a planta em si”, explicou.

A farinha é um dos poucos itens que se pôde reservar, segundo Therezinha. Os peixes sumiram, saindo do meio do rio para margens opostas à enchente. A caça não existe no ecossistema de várzea, pois os animais ou ficam em terra firme ou refugiaram-se nela.

Ajuda

Com todas as dificuldades que a elevação recorde das águas trouxe ao Amazonas, medidas paliativas chegam a todo momento. No fim de fevereiro, a Defesa Civil do Amazonas já havia formado uma equipe de 1.200 voluntários, em municípios do interior do Estado. Estas pessoas receberam cursos específicos para auxiliar a população atingida pela enchente no rio Juruá. O governo federal anunciou medidas de ajuda às vítimasda cheia.

De acordo com o governo do Estado, as cidades de Borba, Tapauá, Manaquiri, Urucará, Careiro Castanho, Fonte Boa, Alvarães, Parintins, Rio Preto da Eva, além de São Sebastião do Uatumã, Tefé, Jutaí, Japurá, Maués, Codajás, Boa Vista do Ramos e Uarini devem receber o auxílio nos próximos dias. As famílias atingidas por enchentes recebem cestas básicas e kits de higiene, medicamentos, kits dormitório, além de filtros microbiológicos e hipoclorito de sódio também são distribuídos à população.


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